quinta-feira, 26 de abril de 2018

Colecção Bonelli 3 - Dylan Dog: A Saga de Johnny Freak

Tal como no volume anterior, o prefácio deste primeiro volume dedicado a Dylan Dog também é meu. Depois de Mater Morbi, é sempre um prazer voltar a escrever com espaço sobre um dos meus personagens de BD favoritos. Aqui vos deixo com o prefácio e com o texto que escrevi para o Público sobre este volume e que poderão ler clicando na imagem.

UM FREAK CHAMADO JOHNNY

Qualquer História da Banda Desenhada que o leitor consulte, assinala o ano de 1986 como um ano-charneira em termos da evolução da arte sequencial. Basta lembrar que foi nesse mesmo ano que foram publicadas obras absolutamente seminais como Maus, de Art Spiegelman, Watchmen, de Alan Moore e Dave Gibbons e O Regresso do Cavaleiro das Trevas, de Frank Miller
Mas não foi só nos EUA que 1986 foi um ano marcante no que à BD diz respeito. Também em Itália as coisas estavam a mudar, com a publicação, em Setembro de 1986, de uma nova série da editora Bonelli. Uma série escrita por um escritor ainda à procura do seu primeiro sucesso, Tiziano Sclavi, e protagonizada por um detective vegetariano, com um passado de alcoolismo, que sofre de claustrofobia e vertigens e investiga casos sobrenaturais, Dylan Dog. Conforme escreveu o próprio Sclavi trinta anos depois, o primeiro número de Dylan Dog foi recebido com uma “enorme explosão de total indiferença”, ficando, em termos de vendas, no limite do cancelamento. Mas pouco a pouco, a série soube conquistar um público cada vez mais vasto, até se tornar um verdadeiro fenómeno, não só de vendas, mas também cultural. O grande trunfo de Dylan Dog foi conseguir chegar a um público bem mais abrangente do que os tradicionais fãs de BD (ou no caso italiano, dos fumetti) e conquistar leitores junto dos cinéfilos, dos intelectuais como Umberto Eco, dos cultores da literatura e do cinema de terror e, sobretudo, junto do público feminino, conquistando milhares de jovens leitoras - que não conseguiram resistir ao charme e às fragilidades, que aumentam esse charme, de Dylan Dog - algumas das quais, como Paola Barbato, Barbara Baraldi, Rita Porretto e Silvia Mericone, iriam passar décadas depois, de leitoras a escritoras das aventuras do detective do oculto. 
Em Portugal, Dylan Dog fez a sua estreia só em 2017, na terceira série da colecção Novela Gráfica, com Mater Morbi, uma história assinada por Roberto Recchioni, o actual responsável editorial da série, bem representativa dos diferentes caminhos trilhados recentemente pela personagem. Para a estreia de Dylan Dog nesta colecção dedicada à editora Bonelli, que vai também encerrar, a opção recaiu em Johnny Freak, uma história mais clássica, onde não falta o dedo do seu criador, Tiziano Sclavi.
Invariavelmente presente na lista das melhores histórias de Dylan Dog de todos os tempos, Johnny Freak foi publicado originalmente em 1993, no número 81 da revista mensal do detective do pesadelo. Contrariamente ao que era habitual nesta época, em que normalmente Tiziano Sclavi lançava a ideia-base para a história, que depois era desenvolvida por outros escritores, no caso de Johnny Freak, o processo foi o inverso. A ideia da história partiu do editor Mauro Marcheselli e coube a Sclavi desenvolver o argumento e os diálogos. Mas essa não é a única particularidade desta história, onde, por uma vez, os horrores sobrenaturais dão lugar a um horror bem real, de uma criança muda a quem são removidas cirurgicamente as pernas, um rim e um pulmão. Inspirada por um artigo sobre tráfico de órgão humanos no Brasil, que Marcheselli tinha lido numa revista, esta história de ficção teria confirmação na realidade mais de uma década depois, em 2005, com o célebre caso de James Whitaker, que foi gerado e nasceu expressamente com o objectivo de ser dador de medula para o seu irmão Charlie, afectado por uma doença degenerativa mortal.
Numa das raras entrevistas que deu, Sclavi, quando lhe perguntaram se se identificava com Dylan Dog, respondeu: “Nem com Dylan, nem com Groucho. Eu sou os monstros.” E essa identificação é bem evidente nesta história, em que o verdadeiro mal se esconde nas pessoas de boa aparência e o corpo deformado de Johnny esconde uma alma de artista e um coração de ouro.  Tal como os leitores, que não conseguiram resistir à fragilidade e à ternura de Johnny, o próprio Sclavi também não resistiu a alterar o final mais duro imaginado por Marcheselli, criando um novo final que, segundo o próprio, “foi escrito enquanto as lágrimas caiam sobre o teclado do computador”.
Essa emoção que Sclavi conseguiu transmitir à história, ajudou a que esta se tornasse um dos episódios mais inesquecíveis da série, mas seria injusto não referir o contributo decisivo do desenhador Andrea Venturi, cujo traço elegante e realista, a fazer lembrar Neal Adams, serve de forma admirável as diferentes nuances da narrativa.
Alternando um realismo dinâmico, com um traço mais onírico e expressionista quando reproduz os desenhos de Johnny, Venturi revela-se perfeito, tanto em termos gráficos como narrativos, para uma história com esta importância. Tratando-se de uma história escrita por Sclavi, não podiam falar as referências cinematográficas, sendo a mais óbvia, até pela alcunha que a imprensa dá a Johnny, ao filme Freaks, de Todd Browning, um clássico de 1932 cuja cassete vídeo o escritor emprestou a Andrea Venturi para que este o visse com atenção antes de começar a desenhar a história.
Se o sucesso de Johnny Freak tornava a sua continuação uma opção óbvia em termos comerciais, a forma como a história acabava, não deixava propriamente grande espaço para continuações… Daí que o trabalho de Marcheselli e Sclavi não fosse nada óbvio, nem fácil, o que só vem confirmar a grande capacidade, narrativa e criativa, destes dois grandes profissionais da escrita. Publicada originalmente em 1997, no número 127 da revista mensal, O Coração de Johnny reúne a mesma equipa de Johnny Freak, com a excepção do desenhador, pois Andrea Venturi tinha passado a desenhar a série Tex. Para o substituir, Sclavi escolheu um dos seus desenhadores favoritos; Giampiero Casertano, cuja cumplicidade com Sclavi é bem evidente na carta do escritor que reproduzimos no fim deste volume e que, não por acaso, seria também escolhido para desenhar Doppo un Lungo Silenzio, o regresso do escritor aos argumentos da série em 2016, por ocasião do trigésimo aniversário de Dylan Dog.
Senhor de um traço mais sombrio e caricatural do que Venturi, Casertano tinha um duplo desafio pela frente, pois tinha de se aproximar graficamente do desenho de Venturi nas várias cenas de flash-back que enchem a história, sem abdicar do seu estilo próprio e inconfundível, marcado por um muito conseguido jogo de sombras. A verdade é que o artista milanês, que para os desenhos de Johnny vai beber inspiração em Picasso e Bosch, conseguiu superar com distinção os dois desafios, conseguindo que, pelo menos em termos gráficos, esta continuação esteja perfeitamente à altura do original.

domingo, 22 de abril de 2018

Conversa com André Diniz sobre a BD no Brasil


Em Março do ano passado, por ocasião da segunda edição do Coimbra BD, onde teve uma exposição, o premiado autor brasileiro André Diniz passou por Coimbra e, além das actividades inerentes à mostra, participou também numa conversa na Faculdade de Letras, promovida pelo Instituto de Estudos Brasileiros, que tive a honra (e o prazer) de moderar, a convite do Professor Osvaldo Silvestre. Uma conversa/entrevista de quase uma hora, em que falamos sobre a Banda Desenhada (ou quadrinhos) no Brasil, detendo-nos mais no trabalho do André Diniz e, em especial, no Moro da Favela e em O Idiota, dois títulos que estavam em destaque na exposição que o Coimbra BD lhe dedico. Finalmente, mais de um ano depois, o vídeo dessa conversa está disponível na página do Instituto e também aqui, para os visitantes mais corajosos, que tiverem paciência para ouvir dois amigos a falar sobre Banda Desenhada durante quase uma hora...

sexta-feira, 20 de abril de 2018

Colecção Bonelli 2 - Dampyr: Aventuras em Portugal


Colecção Bonelli - Vol 2 
Dampyr – Aventuras em Portugal
Quinta-feira, 19 de Abril
Argumento – Mauro Boselli e Giovanni Eccher
Desenhos – Alessandro Bocci e Maurizio Dotti
Por + 10,90€

Como geralmente acontece quando sou eu a autor da introdução do volume, deixo-vos com essa mesma introdução. Quanto ao texto de apresentação que escrevi para o jornal Público, basta carregar na respectiva imagem, aqui ao lado,  para o poder ler.

UM CAÇADOR DE VAMPIROS EM PORTUGAL

Seja através do cinema, da literatura, ou da BD, a figura do vampiro está cada vez mais enraizada no imaginário da cultura de massas, tanto no Ocidente, como no Oriente. Um sucesso natural, a que não é alheia a grande carga erótica inerente ao conceito de um ser imortal, que suga a vida às suas presas. Um fascínio que tem sido devidamente aproveitado pelo cinema, mas também pela BD, que ao longo de décadas tem sabido reinventar esse arquétipo das mais variadas formas.
Foi o que aconteceu também com Mauro Boselli e Maurizio Colombo, dois argumentistas habituais da casa Bonelli ao criarem em 2000 a série Dampyr, a quem este volume é dedicado. De acordo com o folclore das Balcãs, o Dampyr é fruto da união de um vampiro com uma mulher mortal, sendo por isso alguém que está entre dois mundos e cujo sangue pode destruir os vampiros. O herói involuntário desta série é Harlan Draka, um Dampyr que no início não tem consciência dos seus extraordinários poderes, nem sabe bem como usá-los, mas que acaba por descobrir que, embora tenha conseguido não se envolver na guerra que assola a sua região, não vai poder deixar de tomar partido na guerra contra os vampiros, como Gorka, o mais poderoso vampiro da região, contando como aliados com um militar, Kurjak, e com Tesla, uma vampira que se quer libertar da influência do seu senhor, Gorka.
Boselli e Colombo escolheram como cenário inicial para a aparição do mal simbólico (os vampiros) um espaço martirizado pela guerra, onde o mal é bem real: os Balcãs. Mas os países que formavam a antiga Jugoslávia são apenas a primeira etapa no eterno combate entre o Dampyr e os vampiros. Um combate que vai levar Harlan Draka a diversos países, incluindo Portugal, cenário das duas aventuras que este volume recolhe.
A primeira, O Esposo da Vampira, assinada por Mauro Boselli e Alessandro Bocci,  publicada originalmente em Itália no  nº 75 da série mensal, leva Harlan Draka e o seu amigo Kurjak até Trás-os-Montes, investigar a lenda do Castelo de Monforte da Estrela, que dizem estar assombrado por uma vampira.
E, se os autores mostram grande cuidado na descrição da aldeia fictícia de Riba Preta, ou no Castelo de Monforte da Estrela, já em termos históricos, a coisa resvala um pouco, quando Mauro Boselli põe uma das personagens a dizer que o Castelo tinha a forma actual desde o reinado de D. Dinis, que o erigiu para manter os mouros longe. O problema é que Dom Dinis, que nasceu em 1261 e só se tornou Rei em 1279, nunca teve propriamente que se preocupar com os Mouros, que tinham abandonado o território português antes de ele nascer, em 1249, ano em que a conquista de Faro, Albufeira e Silves, por Dom Afonso III, pai de Dom Dinis, põe oficialmente fim à reconquista portuguesa, pelo que a preocupação de Dom Dinis seriam os castelhanos, nunca os mouros... De qualquer modo, estamos perante uma obra de ficção, não um tratado de História, em que Bocci desenha de forma perfeita os cenários transmontanos e tanto os nomes portugueses, como algumas expressões coloquiais, aparecem correctamente escritos. Apesar desse rigor, habitual na casa Bonelli  Portugal aqui pouco mais faz do que ceder as suas paisagens para cenário de uma história que gira em torno do cinema, homenageando, de forma mais ou menos directa, os grandes clássicos do cinema de terror, mas também da BD (veja-se o mordomo Osgood, a quem Bocci dá as feições inconfundíveis do Uncle Creepy, o anfitrião das revistas de terror da editora Warren).
A cena inicial do livro, que acaba por se revelar como uma sequência de um filme de terror, na linha das produções da Hammer, ou das adaptações dos contos de Edgar Poe produzidos por Roger Corman, dá logo o tom, acentuado pelos diálogos. Roland Kirby, assume que pretende ser o Roger Corman do século XXI e transformar a sua actriz na reencarnação de Barbara Steele (a actriz de La Maschera del Demónio, um clássico do mestre do terror italiano, Mário Bava, que já tinha servido de base a uma aventura de Dylan Dog), enquanto que o actor Eddie Chapman evoca Dário Argento, para além de Corman e Bava.
Mas a maior citação cinéfila acontece na cena em que Lucy é fechada dentro de um caixão. Cena que não pode deixar de evocar a mais célebre sequência do filme La Paura de Lúcio Fulci, que Tarantino também homenageou no seu Kill Bill. E, prosseguindo com as metáforas cinematográficas, não é demais salientar o trabalho de Alessandro Bocci como director de fotografias deste filme de terror em papel, com o extraordinário desenhador italiano, que tem trabalhado sobretudo na série Tex, a mostrar um traço clássico, de grande pormenor e legibilidade, muito bem servido por um excelente uso de tramas.
Harlan regressa a Portugal em Tributo de Sangue, história de Giovanni Eccher e Maurizio Dotti, publicada em Itália no Dampyr 147, em 2012, desta vez para fazer a rota do Vinho do Porto. Como refere Echer: “A história começa no Porto mas depois desloca-se para todo o vale do Douro: parte das construções de Vila Nova de Gaia e chega a Miranda do Douro, para depois voltar para os vinhedos dos produtores do Porto no meio dos quais se imagina que há um mosteiro que, embora inventado, é graficamente inspirado em vários conventos e mosteiros portugueses, como o Convento de Cristo em Tomar e o Mosteiro de Santa Maria em Alcobaça.”
Se na primeira história, Boselli tinha inventado a trama sem nunca ter posto os pés em Portugal, no caso de Eccher foram precisamente umas férias em Portugal a estar na origem do episódio. Como refere o escritor: “O motivo por que a trama é ambientada nesses lugares é muito simples: eu fiquei impressionado durante uma belíssima viagem a Portugal. Além disso, como a minha namorada é dona de uma enoteca em Milão, ela foi a minha guia entre os exportadores de Vila Nova de Gaia, que nos acolheram com muita cortesia e nos permitiram visitar as suas caves e provar os seus produtos.”
E aqui, mais do que cenário, o Porto e Portugal influenciaram a evolução da própria história, pois como refere Eccher: “na história também há um fantasma que se manifesta num trajo típico mirandense, um traje que achei realmente inquietante. E há ainda uma cena de acção que acontece na ponte D. Luís I, que eu imaginei no local e depois inseri no roteiro quando regressei a Itália.”
Já Dotti, que nunca tinha estado no Porto, reconstitui os cenários portugueses com grande rigor, tendo por base as fotografias que Eccher tirou durante as férias, confirmando que não é só um excelente desenhador de cenas de acção.
São estas duas belas aventuras de Dampyr, ambientadas no nosso país, que os leitores portugueses vão finalmente poder ler nas páginas seguintes deste segundo volume da colecção dedicada à editora Bonelli e aos seus mais carismáticos personagens.

quinta-feira, 12 de abril de 2018

Colecção Bonelli 1 - Tex: A Lenda de Tex


TEX ABRE COLECÇÃO DEDICADA À EDITORA BONELLI

Colecção Bonelli - Vol 1
Tex: A Lenda de Tex
Argumento – Manfredi, Burattini, Rauch e Ruju
Desenhos – Biglia, Rubini, Bocci e Tisselli
Quinta, 12 de Abril
Por + 10,90 €
Depois da publicação de Mater Morbi, uma aventura de Dylan Dog incluída em 2017 na terceira série da colecção Novela Gráfica, os fumetti (nome dado à BD em Itália) da Bonelli regressam a Portugal, agora com uma colecção de 10 volumes inteiramente dedicada à editora de Milão. Naturalmente, no ano em que completa 70 anos de existência, a honra de abrir esta colecção cabe obviamente a Tex Willer, o ranger do Texas criado por Giovanni Luigi Bonelli e Aurelio Galleppini em 1948, cujo sucesso perene ajudou a escrever a história da editora Bonelli.
Mas, para além de Tex e de Dylan Dog, que têm direito a dois volumes cada (um com histórias curtas a cores, outro com histórias mais longas a preto e branco), esta colecção acolhe ainda outras personagens carismáticas da mais popular editora italiana de fumetti, como Dampyr, o caçador de vampiros, Martin Mystère, o detective do impossível, Julia Kendall, a criminóloga com as feições de Audrey Hepburn, o explorador Mister No, para além de dois dos mais recentes sucessos da Bonelli, as séries Le Storie e Dragonero
A Lenda de Tex, o volume que abre esta colecção, recolhe quatro histórias a cores de 32 páginas cada, publicadas originalmente na revista semestral Color Tex entre 2013 e 2016. A primeira, O Último da Lista, escrita por Gianfranco Manfredi e desenhada por Stefano Biglia – que assegura também a arte da magnífica capa, feita em exclusivo para a edição portuguesa - inspira-se, como o próprio nome do Hotel em que Tex fica hospedado e o apelido do seu proprietário denunciam, em The Blue Hotel, conto do romancista norte-americano Stephen Crane. Aqui, Tex chega a uma pequena cidade do Nebraska no meio de uma tempestade de neve para investigar, a pedido do comandante do forte Robinson, um caso de desvio dos fornecimentos de trigo ao exército, acabando por encontrar Scott Wannabe, um caçador de recompensas com quem se cruzou no passado, que está ali em busca do último membro de uma quadrilha de assaltantes que persegue há 17 anos.
Em O Mescalero sem Rosto, história escrita por Jacopo Rauch, Tex e Kit Carson defrontam o misterioso El Lisiado, numa aventura cheia de acção, ilustrada por Alessandro Bocci, desenhador habitual da série Dampyr, cujo talento poderemos voltar a apreciar no próximo volume desta colecção, ilustrando uma história de Dampyr passada em Trás-os-Montes.
Em Chupa-Cabras!, uma história com um toque fantástico, com texto de Moreno Burattini e grafismo de Michele Rubini, Tex e Jack Tigre ajudam o Professor Dawson, um naturalista, a encontrar os misteriosos chupa-cabras, umas estranhas e mortíferas feras que deixam as suas vítimas completamente exangues.
Finalmente em Desafio na Velha Missão, em que Sergio Tisselli ilustra magnificamente a aguarela uma trama concebida por Pasquale Ruju, num dos raros exemplos de uma aventura de Tex ilustrada em cor directa, Tex e Kit Carson conseguem resgatar Patricia Graves à tribo de Apaches que a tinha raptado, para descobrirem que o vínculo que a unia a Octavio, o apache que a raptou, era bastante diferente e bem mais forte do que eles pensavam.
Quatro histórias bem diferentes, tanto em termos temáticos como gráficos, bem reveladoras da qualidade e da diversidade que as aventuras de Tex Willer podem atingir.
Publicado originalmente no jornal Público de 07/04/2018

terça-feira, 10 de abril de 2018

Apresentação da colecção Bonelli

Aproveitando a comemoração em 2018 dos setenta anos da criação de Tex, a sua personagem mais emblemática, o Público e a Levoir dão a descobrir aos leitores portugueses o melhor da Bonelli, a mais popular editora italiana de BD. Exemplo máximo da riqueza e da diversidade dos fumetti (a BD italiana) a Bonelli não se resume a Tex e a Dylan Dog, os seus heróis mais famosos, já editados em Portugal. São esses e outros personagens, como Dampyr, Martin Mystère, Julia, Mister No, ou Dragonero, ou projectos como a série Le Storie, que chegam finalmente a Portugal numa colecção de 10 volumes, totalmente inéditos. A partir de 12 de Abril, as quintas-feiras são o dia dos fumetti da Bonelli.
OS FUMETTI DA EDITORA BONELLI

Depois da presença de Mater Morbi, uma história de Dylan Dog na série de 2017 das Novelas Gráficas, que provou (se preciso fosse) que uma produção dirigida ao grande público também pode ter qualidade literária, chegou a vez de o Público dar a descobrir aos leitores portugueses o melhor da editora Bonelli, através de algumas das seus personagens mais emblemáticas, em histórias assinadas por alguns dos maiores nomes da BD italiana e mundial.
Mas para que o leitor perceba do que falamos quando falamos dos fumetti (nome dado à BD em Itália) da Bonelli, convém traçar de forma breve a história da editora. Embora só tenha adoptado o nome de Sergio Bonelli em 1988, a história da Editora Bonelli começa bastante antes. Mais precisamente em 1940, quando Giovanni Luigi Bonelli, pai de Sergio Bonelli, cria com a mulher, Tea Bertasi, uma pequena editora de BD chamada Redazione Audace. No final da guerra, quando o casal se decide separar, Bonelli passa à mulher a sua parte da editora, que mudou de nome para Editrice Audace, mantendo-se como colaborador free-lancer. Embora, como revela o seu filho Sergio, Tea nunca tenha lido uma BD antes de tomar conta da editora, revelou-se uma sagaz mulher de negócios e a editora foi prosperando. Entre as novas publicações que foram surgindo, estava uma revistinha de formato horizontal (não por acaso, também conhecido por formato italiano), inspirada no formato das tiras de jornal americanas, protagonizada por um ranger do Texas chamado Tex Willer, cujo imediato sucesso surpreendeu até os próprios autores.
Mantendo-se durante décadas nas mãos dos seus criadores originais (Giovanni Luigi Bonelli só deixou de escrever os argumentos de Tex na década de 80 enquanto Galleppini – ou Galep, como costumava assinar – continuou como desenhador do Tex até à sua morte, em 1994) Tex soube cativar ao longo dos anos um número cada vez maior de leitores, traduzindo-se num caso de sucesso crescente, que atravessou gerações e países.
Mas a editora que em 1957 Tea passou para o seu filho Sergio (e que mudou de nome para Edizioni Araldo) não se limitava a publicar Tex, tal como Sergio Bonelli não se limitava ao seu trabalho de editor, escrevendo também argumentos sob o pseudónimo de Guido Nolitta. Uma carreira que Sergio sempre manteve a par com a de editor e que, tendo começado com a série Un ragazzo nel Far West, ficaria marcada pela criação de personagens ainda hoje em publicação, como Zagor (criado em 1961) e Mister No (criado em 1975 e publicado de forma ininterrupta até 2006).
Uma das razões do sucesso das edições da Bonelli (que se chamariam ainda Araldo e Cepim, antes de adoptar o nome de Sergio Bonelli Editore), para além da qualidade das histórias e dos desenhos, passa pelo abandono do formato de tiras e a criação de um formato próprio de 15 x 21 cm (o chamado formato Bonelli), que vinha de encontro às necessidades do mercado, permitindo fornecer aos leitores edições baratas com muitas páginas, lançadas a um ritmo mensal. Essa receita, que consegue aliar uma produção quase industrial, com capacidade de lançar mais de mil páginas por mês, a uma qualidade muito razoável, nasceu como reacção ao boom da TV privada nos anos 70, que veio provocar uma crise no mercado da BD italiano. Face a uma televisão que oferecia programas gratuitos para todos os gostos, Sergio Bonelli optou por propor aos seus leitores verdadeiras novelas gráficas de quase cem páginas, que abarcam os mais variados cambiantes da aventura, capazes de prender a atenção do leitor durante uma hora, ou mais, que vivem muito da notável capacidade produtiva de uma série de argumentistas de talento, aliado a um leque mais alargado de desenhadores.
A reacção dos leitores italianos a esta nova forma de “literatura de gare desenhada” foi entusiástica. Potenciada pelo grande desenvolvimento dos caminhos-de-ferro em Itália, que criou um público heterogéneo que queria ter algo para ler durante as viagens, algumas revistas de Bonelli chegaram a atingir tiragens próximas do meio milhão de exemplares, para além das constantes reedições de títulos antigos, o que levou à impressionante média de 25 milhões de exemplares vendidos por ano, algo que só é possível graças a um público heterogéneo, que não se restringe aos adolescentes habituais e que engloba também quadros médios e universitários, e até intelectuais como Umberto Eco.
Para além das personagens clássicas, como Tex, Zagor e Mister No, a que se juntaram outras como Martin Mystère, Dylan Dog, Dampyr, Júlia e Magico Vento, a editora tem sabido renovar-se apostando em novos tipos de séries, de que Dragonero e Le Storie são exemplos.
Mesmo a morte de Sergio Bonelli em 2011 foi superada, graças à dinâmica introduzida pelo filho Davide e a sua equipa, que soube apostar em novos formatos - como os álbuns a cores em formato franco-belga do Tex - e incrementou de forma decisiva a presença das edições da Bonelli nas livrarias.
Por isso, mesmo no século XXI, em que a concorrência dos smartphones leva a que se veja cada vez menos gente a ler livros nos transportes públicos, é facílimo encontrar os títulos da Bonelli em qualquer quiosque de estação, o que justificava que, apesar da queda geral das vendas nos quiosques, as revistas da Bonelli ainda vendiam em 2014 mais de 500.000 exemplares dos títulos mensais regulares mensais, com Tex e Dylan Dog bem destacados, ao mesmo tempo que as edições para livraria permitiam valorizar o vastíssimo catálogo da editora junto de um público mais sofisticado.
Embora seja um fenómeno marcadamente italiano, as séries de Bonelli também têm procurado o sucesso internacional, estando presentes de forma mais ou menos regular nas livrarias e quiosques do Brasil, Sérvia, Croácia, Turquia, Espanha, França e Estados Unidos. Finalmente chegou a vez também de Portugal e agora, caberá ao leitor português decidir se chegou para ficar.

AS PERSONAGENS

TEX
Criado em 1948 por Gianluigi Bonelli e Aurelio Galeppini, Tex Willer é, depois do Lucky Luke de Morris, o mais antigo cowboy da BD europeia ainda em publicação. Ranger do Texas, Tex tem também uma profunda ligação aos índios americanos, tendo tido um filho, Kit com Lilith, a filha de um chefe Navajo e sendo ele um próprio chefe de uma tribo de Navajos, que lhe deram o nome índio de Águia da Noite. Só, ou acompanhado pelos seus amigos Kit Carson e Jack Tigre e pelo seu filho Kit, Tex impõe a lei no velho Oeste de forma implacável.

DAMPYR
Criado em 2000 por Mauro Boselli e Maurizio Colombo, Harlan Draka é um Dampyr, o fruto da união de um vampiro com uma mulher mortal, alguém que está entre dois mundos e cujo sangue pode destruir os vampiros. Acompanhado por Kurjak, um militar sérvio, e por Tesla, uma vampira que se quer libertar da influência do seu mestre, o vampiro Gorka, Harlan Draka e os seus companheiros percorrem o globo à caça de vampiros e outras criaturas sobrenaturais. Uma missão que os leva a sítios tão diferentes como a antiga Jugoslávia, África, o Japão e, no caso desta colecção, a Portugal.

DYLAN DOG
Criado por Tiziano Sclavi em 1986, Dylan Dog é um detective particular, sediado em Londres e especializado em casos paranormais e fantásticos, visualmente inspirado no actor Rupert Everett, que rapidamente se tornou um verdadeiro fenómeno de culto, cuja popularidade extravasou rapidamente o público tradicional da BD. Ex-alcoólico e vegetariano, com uma irremediável tendência para se apaixonar pelas suas clientes, Dylan Dog é um detective pouco convencional, com um ajudante ainda menos convencional, que é um sósia, a todos os níveis de Grouxo Marx, com um sentido de humor delirante, que  serve de alívio cómico ao dramatismo das histórias. 

JULIA
Criada em 1998 por Giancarlo Berardi, com a colaboração de Luca Vannini na parte gráfica, Júlia Kendall é uma criminóloga e professora universitária, cuja imagem é inspirada na actriz Audrey Hepburn, e que tem uma empregada doméstica com as feições de outra actriz famosa, Whoopi Goldberg. Colaborando com a polícia de Garden City – a cidade fictícia onde vive, cujas ruas têm nomes de flores – Júlia Kendall utiliza os seus vastos conhecimentos teóricos para investigar os mais diversos casos de homicídio.

LE STORIE
Inspirada pela mítica colecção Un Uomo, un’Avventura, uma das experiências editoriais mais prestigiadas da Bonelli, Le Storie, ao contrário da maioria dos títulos da editora, não tem um personagem fixo. Esta série, criada em 2012, acolhe verdadeiras histórias sem heróis, tendo geralmente como pano de fundo um acontecimento histórico concreto. No caso de Sangue e Gelo, esse acontecimento é a retirada das tropas de Napoleão da Rússia, em 1812, em que o “General Inverno” acaba por não ser o único inimigo que as desgastadas tropas do Capitão Lozère têm de enfrentar.

MARTIN MYSTÈRE
Criado em 1982 por Alfredo Castelli, Martin Mystère, o “detective do impossível”, é um verdadeiro “Homem do Renascimento”. Antropólogo, arqueólogo, especialista em História da Arte, Línguas e Cibernética, investigador, apresentador de programas de TV, escritor, aventureiro e iniciado nos cultos esotéricos, Martin Mystère utiliza a sua vastíssima cultura para desvendar os mais variados enigmas. Sediado em Nova Iorque, Mystère enfrenta o perigo com o apoio do seu fiel Java, um corpulento Homem de Neanderthal. 

DRAGONERO
Criada em 2007 por Luca Enoch e Stefano Vietti como uma história única para a série Romanzi a Fumetti Bonelli, Dragonero acabaria por se converter numa revista mensal em 2013. O protagonista desta série que introduz a Heroic Fantasy no catálogo da Editora Bonelli, é Ian Arànil, explorador do Império Erondariano e herdeiro da nobre e antiga casa dos Varliedàrto, os caçadores de dragões. Acompanhado por Gmor Burpen, um ogre com um invulgar gosto pela leitura e pela ninfa Sera, Ian vive as mais incríveis aventuras num mundo de fantasia, cuja complexidade e coerência estão à altura da herança de autores como Robert E. Howard, Tolkien e George R. R. Martin. 

MISTER NO
Criado por Guido Nolitta (pseudónimo que Sergio Bonelli usava para assinar os argumentos que escrevia) em 1975, Mister No é um aventureiro radicado na selva amazónica. Nascido Jerry Drake, Mister no é um antigo piloto de guerra americano que depois da Guerra da Coreia, incapaz de se readaptar à vida civil, decide deixar os Estados Unidos e ir viver para Manaus, no Brasil, onde ganha a vida como guia na selva amazónica, o que, por vezes, o leva a envolver em situações que o obrigam a fazer apelo à sua experiência militar.

João Miguel Lameiras*

* com agradecimentos a Mário João Marques pelas informações sobre a série Dragonero.


SERGIO BONELLI: UM HOMEM, MIL AVENTURAS

Nascido em Milão em 1932 e falecido em Monza em 2011, Sergio Bonelli foi não só um dos maiores editores europeus de Banda Desenhada, responsável pela criação de um império editorial cuja actividade prossegue pela mão do seu filho Davide mas também um prolífico argumentista e um incansável viajante.
Filho de Giovanni Luigi Bonelli, o criador di Tex, Sergio esteve ligado à edição desde muito novo, trabalhando na editora Audace, que o seu pai fundou e que, em 1946 passou para a sua mãe, Tea, quando os dois se separaram. Em 1957 sucede à mãe no comando da editora, ao mesmo tempo que concilia a parte administrativa com a actividade de argumentista, com o pseudónimo de Guido Nolitta, nome que encontrou numa lista telefónica e que usou para não ser confundido com o pai. A sua estreia como escritor de BD deu-se em 1958 com a série Un Ragazzo nel Far West, mas o seu primeiro grande sucesso chegou em 1961, com a criação de Zagor, personagem que, confessa, resultou da tentativa de “fazer algo especial para um público especial, misturando as mais variadas referências. A minha aposta foi fazer uma espécie de Frankenstein, pegando um bocado do Tarzan, outro bocado do Super-Homem, etc… E a coisa funcionou!” 
Outra criação sua foi Mister No, um aventureiro na Amazónia, que sempre foi a sua personagem favorita, mas além disso escreveu também diversas histórias de Tex, embora a sua prioridade fosse o trabalho de editor, marcado pelo respeito pelos autores, a quem dava grande liberdade para desenvolver os seus próprios projectos, como aconteceu com Tiziano Sclavi em Dylan Dog e com Alfredo Castelli em Martin Mystère.
Mas o contributo de Sergio Bonelli para a BD italiana, não se fica só pelas revistas mensais que editou, que mostram que a BD de qualidade não tem que ser necessariamente luxuosa e cara. Também apostou em outros formatos, a começar pelos famosos “Texones”, as edições anuais do Tex em formato grande, assinadas por grandes nomes da BD Mundial, como Buzelli, Alfonso Font, Magnus, Jordi Bernet, Joe Kubert, ou Enrique Breccia. E promoveu também projectos de grande importância como a mítica série Un Huomo, una Aventtura, por onde passaram os maiores nomes da BD italiana, como Hugo Pratt, Milo Manara, Guido Crepax; Dino Battaglia, Sergio Toppi e Guido Buzzelli. Isto para além de ter dado a grandes desenhadores espanhóis como Victor De La Fuente, Esteban Maroto, José Ortiz, Alfonso Font, ou Manfred Sommer, a possibilidade de prosseguirem uma carreira na BD de acção e aventura, quando terminou o boom das revistas de BD em Espanha.

A COLECÇÃO

1 – Tex – A Lenda de Tex
12 de Abril
Argumento – Manfredi, Buratini, Rauch e Ruju
Desenhos – Biglia, Rubini, Bocci e Tisselli
A honra de abrir esta colecção cabe naturalmente a Tex, que completa 70 anos de existência em 2018. Este volume recolhe quatro histórias a cores publicadas originalmente na revista Color Tex: O Último da Lista, escrita por Gianfranco Manfredi e desenhada por Stefano Biglia; O Mescalero sem Rosto, com argumento de Jacopo Rauch e arte de Alessandro Bocci; Chupa-Cabras!, com texto de Moreno Burattini e grafismo de Michele Rubini; e Desafio na Velha Missão, em que Sergio Tisselli ilustra magnificamente a aguarela uma trama concebida por Pasquale Ruju.

2 –Dampyr – Aventuras em Portugal
19 de Abril
Argumento – Mauro Boselli e Giovanni Eccher
Desenhos – Alessandro Bocci e Maurizio Dotti
Este volume recolhe duas aventuras de Dampyr que têm como cenário o nosso país. Em O Esposo da Vampira, Mauro Boselli e Alessandro Bocci levam o caçador de vampiros Harlan Draka e o seu amigo Kurjak, até Trás-os-Montes, para investigar a lenda do Castelo de Monforte da Estrela, que dizem estar assombrado por uma vampira. Já em Tributo de Sangue história de Giovanni Eccher e Maurizio Dotti, publicada em Itália em 2012 no Dampyr 147, é o Porto, Vila Nova de Gaia e a zona do Douro que servem de cenário a uma história que envolve um fantasma com um traje mirandense e uma tentativa de assassinato na ponte D. Luís I.

3 – Dylan Dog – A Saga de Johnny Freak
26 de Abril
Argumento – Mauro Marcheselli e Tiziano Sclavi
Desenhos – Andrea Venturi e Giampiero Casertano
Este volume que assinala o regresso de Dylan Dog à edição nacional, recolhe duas histórias escritas por Tiziano Sclavi, o criador de Dylan Dog, a partir de uma ideia do editor Mauro Marcheselli, protagonizadas por Johnny Freak, um jovem mudo e gravemente mutilado. Publicada originalmente em 1993 no nº 81 da revista Dylan Dog, Johnny Freak é considerada como uma das melhores histórias de sempre de Dylan Dog. Este volume recolhe também O Coração de Johnny, uma continuação da história anterior, em que Andrea Venturi cede o lugar a Giampiero Casertano nos desenhos.

4 – Júlia – O Eterno Repouso
3 de Maio
Argumento – Giancarlo Berardi
Desenhos – Sergio Toppi
Em O Eterno Repouso, Júlia Kendall, a criminóloga criada por Giancarlo Berardi investiga um macabro assassinato num lar de idosos, onde um dos utentes aparece literalmente cortado em pedaços. No seu único trabalho para a série, o mestre Sergio Toppi dá mais uma demonstração de todo o seu virtuosismo  ao serviço de uma história com sequencias, como a do pesadelo, pensadas para tirar o maior partido do seu estilo único.

5 – Le Storie – Sangue e Gelo
10 de Maio
Argumento – Tito Faraci
Desenhos – Pascuale Frisenda
Ambientada em finais de 1812, na Rússia do Czar Alexandre I, Sangue e Gelo tem como ponto de partida a retirada do exército napoleónico, desgastado pela estratégia russa da “terra queimada”, deixando atrás de si centenas de milhar de homens à fome, que lutam pela sua mera sobrevivência num ambiente de gelo e horror. Contrários à ideia de se renderem a um destino aparentemente inelutável, os homens do capitão Lozère partem em busca de um pouco de pão e de um abrigo quente, na esperança de uma improvável salvação, acabando por ir ao encontro de um destino imprevisto.

6 – Tex – A pista dos Fora-da-Lei
17 de Maio
Argumento – Mauro Boselli e Claudio Nizzi
Desenhos – Carlos Gomez e Andrea Venturi
Este segundo volume protagonizado por Tex recolhe duas histórias longas a preto e branco. Na primeira, A Pista dos Fora-da-lei, escrita por Mauro Boselli, com desenhos espectaculares do argentino Carlos Gomez, Tex, Carson e Jack Tigre seguem a pista de um bando de assaltantes de bancos capitaneado por Ozzie Johnson. Na segunda história, O Assassino de Índios, um misterioso assassino aterroriza uma tribo de apaches Jicarilla, ao assassinar e escalpar mais de vinte indígenas. Uma ameaça que só Tex e Kit Carson serão capazes de deter. Publicada originalmente no Almanaque Tex de 1996, esta história escrita por Claudio Nizzi, assinala a estreia de Andrea Venturi (o desenhador de Johnny Freak)  na série Tex.

7 –  Martin Mystere – O Destino da Atlântida
24 de Maio
Argumento – Alfredo Castelli
Desenhos – Cardinale, Orlandi e Toppi
Na primeira das histórias deste volume, O Destino da Atlântida cuja acção se inicia nos Açores, Martin Mystère tem de se aliar ao seu inimigo Orloff para trazer de volta à nossa era o satélite militar que provocou a destruição da Atlântida e de Mu, 10 mil  anos antes. O volume termina com Questões de Família, uma história ilustrada por Sergio Toppi, em que a descoberta de uma gravação vídeo traz revelações sobre a presença de extraterrestres no nosso planeta.

8 – Dragonero – A Primeira Missão
31 de Maio
Argumento – Luca Enoch e Stefano Vietti
Desenhos – Manuel Morrone e Cristiano Cucina
Publicada originalmente em 2014, no Speciale Dragonero nº 1, A primeira Missão recorda um episódio do passado de Ian Arànil, o Dragonero, quando este decidiu abandonar o exército do Império e incorporar o corpo dos exploradores. Ian procura o seu amigo, o ogre Gmor, entretanto retirado num mosteiro, para o acompanhar, mas em breve, os dois terão de abandonar o corpo de exploradores e partir em auxílio de um grupo de monges que se encontra preso no interior de uma biblioteca antiga.

9 – Mister No – OVNIs na Amazónia
7 de Junho
Argumento – Tiziano Sclavi e Guido Nolitta
Desenhos – Fábio Civitelli e Roberto Diso 
Nesta edição, com uma capa inédita de Fabio Civitelli realizada em exclusivo para esta edição, a queda de um satélite russo em plena selva amazónica vai provocar a destruição do avião de Mister No e a hostilidade dos indígenas, que vêm no estranho fenómeno um sinal dos Deuses. Para além dessa história de Tiziano Sclavi (o criador de Dylan Dog), ilustrada por Civitelli, este volume traz também Garimpeiros, uma história curta escrita pelo próprio Sergio Bonelli (com o pseudónimo Guido Nolitta)  e desenhada por Roberto Diso.

10 – Dylan Dog – Os Inquilinos Arcanos
14 de Junho
Argumento – Sclavi, Mignaco e Baraldi
Desenhos – Roi, Breccia e Manara
Dylan Dog regressa para encerrar esta colecção, num volume a cores, que recolhe três histórias curtas. Em Os Inquilinos Arcanos, história em três partes de Sclavi e Corrado Roi, publicada originalmente na revista Comic Art, Dylan Dog investiga os estranhos fenómenos que afectam um edifício em Londres.  
Em A Grande Nevada, o argentino Enrique Breccia ilustra uma bela homenagem ao Eternauta, de Oesterheld, escrita por Luigi Mignaco. Finalmente, em Bailando com um Desconhecido, Nives Manara, a irmã do mestre do erotismo, Milo Manara, ilustra uma história de fantasmas escrita por Barbara Baraldi.
Textos publicados originalmente no jornal Público de 10/04/2018

segunda-feira, 9 de abril de 2018

As Melhores BDs que li em 2017 - Parte 2

Conforme prometido, aqui vai a segunda parte da minha lista das melhores BDs que li em 2017. Muitas ficaram de fora, mas tentei fazer uma lista o mais abrangente possível, incluindo BD portuguesa, americana, franco-belga, italiana, japonesa e novelas gráficas, embora por pouco, esta lista não teve ainda mais um título japonês, pois Le Club des Divorcés, de Kazuo Kamimura teria certamente entrado na lista, caso o tivesse conseguido terminar de ler ainda em 2017.  
6 - Grandville: Force Majeure, de Bryan Talbot, Jonathan Cape
As aventuras do Inspector Lebrock, o texugo steampunk criado por Bryan Talbot, chegam ao fim. Esta série, de que tive oportunidade de falar aqui, durou cinco volumes e terminou em beleza com este Force Majeure, mais um belo exemplo da forma brilhante como Talbot misturou as mais diversas referências nesta série policial com animais antropomorfizados em ambiente steampunk.
7 - Histórias do Bairro, de Gabi Beltran e Bartolomeu Segui, Levoir
Este era um dos poucos títulos da última colecção de Novelas Gráficas que eu não conhecia previamente e foi uma excelente surpresa. Relato autobiográfico tocante de uma adolescência passada na marginalidade, Histórias do Bairro é mais um exemplo da grande vitalidade da Novela Gráfica espanhola.
8 - Natures Mortes, Zidrou e Oriol, Dargaud
Zidrou é um dos daquelres autores que podia perfeitamente entrar nesta lista por mais do que um título. desde a excelente série Les Beaux Etés, ou o tocante Lydie, ambos ilustrados por Jordi Lafebre, mas a minha escolha acabou por cair neste Natures Mortes, face ao trabalho gráfico superlativo de Oriol. Biografia de um obscuro pintor catalão, Natures Mortes é uma bela homenagem ao poder da Arte, escrita por um dos mais estimulantes argumentistas de língua francesa das últimas décadas.
9 - Northlanders, de Brian Wood e vários desenhadores, Vertigo
Tal como Tom King e Zidrou, Brian Wood é outro dos autores que podiam perfeitamente estar nesta lista por outro título. A sua série Briggs Land, de que li em 2017 a segunda mini-série, é um bom exemplo da qualidade do seu trabalho, mas este Northlanders tem um sopro épico que pesou na escolha, para além da maior qualidade da parte gráfica, a começar nas magníficas capas de Massimo Carnevale.
10 - Olimpo Tropical, de André Diniz e Laudo Ferreira, Polvo
Se havia dúvidas de que André Diniz é um dos melhores argumentistas brasileiros da actualidade, este Olimpo Tropical vem dissipá-las. Obra menos ambiciosa do que o verdadeiro tour de force narrativo que é O Idiota, Olimpo Tropical assinala o regresso de Diniz ao cenário das favelas do Rio de Janeiro, desta vez numa abordagem mais simbólica do que a de Morro da Favela, muito bem servida pela grande expressividade do traço caricatural de Laudo Ferreira.Só é pena que a capa da Polvo seja bastante inferior à da edição brasileira...

sexta-feira, 6 de abril de 2018

Y, o Último Homem 6 - Entre Mulheres

ATRAVESSANDO O PACÍFICO A BORDO DA BALEIA

Y, O último Homem
Vol. 6: Entre Mulheres
Quinta-feira, 5 de Abril
Argumento – Brian K. Vaughan
Desenhos – Pia Guerra, Goran Sudzuka e José Marzan Jr.
Por + 12,90€
Com a chegada aos quiosques, na próxima quinta-feira, do sexto volume, fica assim concluído o segundo ciclo de publicação da premiada série Y, O Último Homem. Conforme vimos no volume anterior, dois anos depois de uma praga inexplicável ter morto todos os mamíferos portadores do cromossoma Y à face da Terra, os dois únicos sobreviventes – Yorick Brown, um artista de fuga amador, e o seu macaco Ampersand – chegaram finalmente a São Francisco, após uma travessia aventurosa da América na companhia da agente secreta 355 e da especialista em genética Dra. Allison Mann, que conseguiu finalmente isolar a fonte da sua imunidade. Infelizmente, o factor que dá a imunidade à praga está dentro do corpo de Ampersand, que desapareceu, raptado por uma misteriosa mercenária japonesa. Os protagonistas desta saga épica têm agora de partir numa viagem ainda mais arriscada, cruzando o Pacífico num navio em busca da salvação da humanidade.
E é precisamente em alto mar, a bordo do Baleia, um antigo iate de cruzeiros, transformado em cargueiro, que vamos encontrar Yorick e as suas amigas. Se a empatia entre Yorick e Kilina, a capitã do navio – que também tem um macaco capuchino como mascote, embora muito mais bem treinado do que Ampersand – é imediata e rapidamente se transforma em amor, há um lado sombrio de Kilina que Yorick e as suas companheiras de viagem desconhecem e que só vão descobrir tarde demais. Mas claro que, como o leitor da série - habituado aos sucessivos golpes de teatro com que Brian K. Vaughan o costuma surpreender - facilmente podia prever, esta é uma viagem que não está isenta de perigos. Perigos esses que incluem um ataque de um submarino pirata, que pode levar a que a travessia para o Japão acabe no fundo do Oceano Pacífico...
Para dar algum descanso a Pia Guerra e conseguir manter a periodicidade mais ou menos mensal da publicação original, Entre Mulheres, o arco de história deste volume tem desenhos a lápis do croata Goran Sudzuka, que assim regressa à série. Mas graças à mestria da passagem a tinta de José Marzan Jr., a mudança de desenhador principal é apenas perceptível ao olhar dos leitores mais bem treinados.
Quem é uma novidade na equipa desde o volume anterior, é o responsável pelas capas, o italiano Massimo Carnevale. Carnevale, que substituiu J. G. Jones e Aron Wiesenfeld  a partir do número 23 da série original, é um velho conhecido dos leitores que acompanham as colecções que o Público e a Levoir dedicaram à Novela Gráfica, pois são deles os desenhos de Mater Morbi, o volume publicado na última série das Novelas, que assinalou a estreia de Dylan Dog em edição nacional. Se Mater Morbi mostrava a excelência do trabalho de Carnevale em termos de narrativa sequencial, as belíssimas capas que ilustrou para a série Y, O Último Homem confirmam todo seu talento de ilustrador. Talento reconhecido pelos editores, que o mantiveram como ilustrador das capas até ao final da série.
Um final que, tal como Yorick e as suas companheiras terão de esperar pela eventual chegada ao Japão para descobrir as respostas sobre a misteriosa epidemia, também o leitor terá de esperar até 2019 para conhecer, nos quatro capítulos finais desta saga absolutamente viciante.
Publicado originalmente no jornal Público de 31/03/2018

quarta-feira, 4 de abril de 2018

As 10 Melhores BDs que li em 2017 - Parte 1

Este ano com um enorme atraso, motivado por diversos afazeres, cá está finalmente a minha listagem das melhores Bandas Desenhadas que li pela primeira vez em 2017. Tal como no ano passado, há escritores que podiam estar presentes com mais do que um título, como é o caso de Brian Wood,  Zidrou e Tom King. Do mesmo modo, há títulos que poderiam estar aqui pela parte gráfica, mas cujo argumento não está à altura da excelência do trabalho dos desenhadores. É o caso de Corrado Roi em UT e de Gigi Cavenago em Mater Dolorosa, curiosamente duas edições da Bonelli. Mas deixo-vos com a primeira parte da lista, organizada por ordem alfabética, ficando a segunda parte prometida para a próxima semana.


1 - Batman: The War of Jokes and Riddles, Tom King e Mikel Janin, DC
No caso do Batman de Tom King, a dificuldade estava na escolha da história, ou do arco de história, pois King tem conseguido fazer esquecer Scott Snyder, assinando algumas das melhores histórias do batman de sempre.. Neste caso, optei por este The War of Jokes and Riddles graças ao trabalho gráfico superlativo de  Mikel Janin. O desenhador basco, além da qualidade do seu traço tem um sentido de composição notável, criando páginas belíssimas, que lembra o melhor de Gianni de Luca.
2 - Comer/Beber, de Filipe Melo e Juan Cavia, Tinta da China
Mesmo que não seja grande fã do formato escolhido para esta edição e de achar que a primeira história necessitava de "respirar" um pouco mais, não há dúvidas sobre a qualidade deste trabalho que confirma uma dupla criativa em total sintonia. Se quiserem saber mais sobre este livro, cuja segunda história já foi adaptada ao cinema, podem ler aqui
3 - Comissario Spada, de Gianluigi Conano e Gianni de Luca, Oscar/Mondadori
Publicadas originalmente entre 1970 e 1982 no semanário católico Il Giornalino, as aventuras do comissário milanês Eugenio Spada foram finalmente recolhidas num único volume, que permite apreciar a evolução da série dos seus criadores, que acompanham os grandes acontecimentos da sociedade italiana da época, marcada pela guerra contra a Máfia e pelo terrorismo das Brigadas Vermelhas.Visualmente, a evolução de De Luca é espantosa e a forma como ele joga com a página em termos de planificação mantém-se ainda hoje dificilmente alcançável, mesmo que Mikel Janin se tente aproximar.
4 - Cuadernos Japoneses, Igort, Salamandra Graphic
Diário de viagem, BD autobiográfica e reflexão sobre a sociedade e a arte japonesa, este livro do italiano Igort, é isso tudo e muito mais.Relato das suas diversas estadias no Japão, na época em que trabalhou para o mercado japonês, Cuadernos Japoneses é uma viagem fascinante ao país do sol Nascente e à industria do manga, bem demonstrativo da versatilidade do traço de Igort que utiliza diferentes registos gráficos ao longo da história.
5 - El Libro de los Insectos Humanos, Osamu Tezuka, Astiberri
Uma fascinante viagem pela mente de uma "mulher fatal" pelo Deus da BD japonesa, Osamu Tezuka. Publicado originalmente entre 1970 e 1971 este livro demonstra toda a espantosa modernidade do trabalho de Tezuka, bem visível na ambiguidade da história  e na forma como consegue transmitir graficamente a perturbação psicológica das personagens.
CONTINUA...